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Plus ça Change, Plus C'est la Même Chose

domingo, 8 de novembro de 2009




Antes de mais nada, isso é para as pessoas que dizem que eu só falo mal de todo mundo
O título é de um ditado francês: “Quanto mais às coisas mudam, mais elas continuam as mesmas”. Não me perguntem a pronúncia disso porque eu não faço idéia. Acho o idioma francês dolorido aos ouvidos.


 Há mais ou menos uns 7, 8 anos atrás, conheci um garoto chamado Agner. Eu digo garoto porque ele deve ser uns 15 anos mais novo do que eu que tenho 33, não estou certo agora.
É uma mania minha fazer amizade com garotos e garotas bem mais novos do que eu. Não! Eu não sou nenhum pedófilo, mas sempre preferi a companhia dos mais novos do que, como dizia o nosso amigo Saint Exuperry, “as pessoas grandes”. Elas são chatas, sem graça e na maior parte do tempo não entendem nada do que você está tentando explicar. Mas voltemos a falar do Agner.

 Quando eu o conheci, ainda tinha tempo e gosto para sentar numa prancheta e perder horas desenhando e pintando com lápis de cor e canetinhas. Na maioria das vezes fazia o desenho e antes de pintá-lo, ia até a papelaria da esquina tirar xérox. Época boa, o auge dos desenhos japoneses na TV aberta. Todo mundo que gostava de desenhar estava rabiscando Gokus e Majin Boos sem parar. O Agner não era exceção.
Não demorou muito para que estreitássemos a amizade. Depois de tanto tirar cópias dos meus desenhos pra mim, ele veio me pedir aulas particulares.
Os dias corriam agradáveis. Todos as tardes depois do trabalho eu ia para a papelaria e entre um cliente e outro que ele atendia, ficávamos no balcão desenhando e conversando.
 Dizem que a gente sempre busca no outro o que está faltando em nós, sejam amigos ou namoradas(os). Eu sempre tive a mania de admirar as qualidades dos outros, querendo ser igual a eles. Até me lembro uma vez que disse para o Ricardo: “Você não faz idéia de como eu gostaria de acordar um dia, me olhar no espelho e ver que eu sou você”. Bom, mas isso não vem ao caso agora.
O fato é que, o que me encantava no Agner é que a meus olhos ele era o garoto que eu gostaria de ter sido quando tinha a idade dele: bonito, extrovertido, ousado e saliente para a idade. Um conjunto de adjetivos que me fez colocá-lo em um pedestal, mesmo ele sendo tão mais novo do que eu.

 Com mais alguns meses de amizade nos tornamos amigos-irmãos, daquele tipo que vai na casa do outro, almoça, janta, assiste filmes e trata a mãe do outro como se fosse uma tia. Confesso que foi uma das melhores épocas da minha vida. Não tenho vergonha de confessar isso, mesmo com nossa diferença grande de idade. Os melhores períodos da minha vida foram quando segui meus instintos. Fiz o que quis, quando quis e na hora que quis.
Partilhar daquele “universo adolescente” dele era para mim maravilhoso, já que nunca tive uma adolescência realmente. Enquanto a maioria dos caras de 15 anos estava saindo pra catar menininhas na avenida da cidade eu estava em casa vendo Muppets babyes e tomando Nescau.
 Sair com a “galerinha”, andar feito um idiota pela avenida da cidade sem parar, sentar na sarjeta as 2 da madrugada e conversar era um mundo mágico pra mim. Mundo que eu estava descobrindo com ele. O detalhe é que eu nessa época devia ter o que, uns 27 anos? Detalhes. Eu sentia como se eu estivesse resgatando a adolescência perdida. Ficamos nisso por um bom tempo. Eu, ele e os amigos dele que também se tornaram meus amigos.
Dentre os meus muitíssimos defeitos, um dos mais graves é achar que se a situação está satisfatória para mim, também está satisfatória para o outro. Trocando em miúdos, eu vivo supondo erroneamente que se eu não preciso de mais ninguém no mundo além daquele amigo, ele também não precisa de mais ninguém além de mim. Eu fico tão apegado a pessoa que acho que meu mundo está completo. Acabo achando que a pessoa sente o mesmo que eu.

O fato é que as pessoas crescem, a vida anda pra frente e as coisas mudam. As garotinhas menstruam e os garotos param de desenhar heróis japoneses e descobrem que outras coisas são muito mais divertidas.

Dos montes de coisas que ouço meus amigos dizerem pra mim, duas palavras que sempre me fazem perder o chão, entrar em depressão profunda e me sentir mais inferior que uma barata são “minha namorada”.
Como sou tímido e covarde demais pra arrumar namorada, sem falar que minha auto estima é péssima, vivo me grudando em amigos para compensar a falta disso. A coisa geralmente vai bem, até o momento em que eles decidem arrumar uma alguém. Aí o bicho pega legal. Com o Agner não foi diferente.
Quando sou comunicado disso pelo amigo, na maioria das vezes tenho que fazer um esforço sobre-humano para fingir que o que ele acaba de me dizer não me deixou com vontade de sair pro meio da rua e me jogar na frente do primeiro ônibus que passar. Faço uma ou duas perguntas sobre a garota e vou pra casa pensando em como ter uma morte rápida.

Pra essas ocasiões, geralmente tenho um plano A e um B, pro caso do A falhar e geralmente falha.
Meu plano A é formar um bizarro triângulo amoroso com o casal, ou seja, “se não pode vencê-los, junte-se a eles”. Pra não perder e nem me afastar do amigo, só me resta então tentar ser o melhor amigo que a namorada do cara já teve. Uma espécie de agente duplo. Entretanto como eu disse o plano A geralmente não dá certo, já que me forçar a engolir a garota pra poder ficar perto do amigo é pra mim terrivelmente torturante. E quando chega nisso, coloco em prática o plano B... O qual também não dá certo, só pra constar. ¬¬’

O plano B consiste no ridículo “ou ela ou eu”. O que além de ridículo é uma tremenda viadagem, já que por razões mais do que óbvias o amigo vai sempre optar pela namorada.
Uma vez uma conhecida minha me disse que, nessa briga de amigo e namorada não adianta teimar. Se o seu amigo for forçado a escolher entre você e a namorada é certeza mais do que absoluta que nessa você não leva vantagem, afinal como ela disse, “você ele não pode beijar e nem transar”. Putz, graças a Deus que não!
É para essas ocasiões então que eu, que adoro dar murro em ponta de faca, criei um plano B+: “Se você não me der atenção, eu estou de mal de você”. Adivinhem se funciona? ¬¬’

Com o Agner usei o plano A.
Além do plano falhar ainda dei um tiro no pé, já que a namorada do cara confiou tanto em mim que parou de confiar nele, o que confesso, foi agradável. Mas em relação ao tiro no pé. Vocês se lembram dos finais do desenho do He-Man, onde sempre vinha algum personagem nos mostrar qual foi a lição de moral do dia no episódio? É isso aí!
“Pois é amiguinhos, no episódio de hoje aprendemos que não é uma boa idéia tentar jogar a namorada do amigo contra ele. Até a próxima!”

“Se o seu amigo for forçado a escolher entre você e a namorada é certeza mais do que absoluta que nessa você não leva vantagem”.

Brigamos feio e com razão. Ele me acusou de muitas coisas e com razão. Geralmente quando isso acontece comigo passo pelas seguintes fases:

  • Pânico
  • Culpa
  • Ódio
  • Indiferença

Pânico por, depois de ter jogado a merda no ventilador e já ser tarde demais, perceber a cagada que eu fiz. Culpa por me sentir um monstro, cretino, imbecil e retardado e por ter feito o que fiz. Ódio pelo fato de apesar de eu implorar o perdão da pessoa ela não me perdoar. E indiferença por último, afinal, já que a pessoa não quis me perdoar e não quer mais saber de mim, por que é que eu vou ficar perdendo meu tempo e sofrendo por ela?

Ficamos sem nos falar por quase um ano. Ouvir a voz dele na rua me fazia passar mal. A simples menção do nome dele me irritava. Se nos trombássemos na rua, imediatamente fechávamos a cara e fingíamos que um não viu o outro. Foram meses difíceis de passar. Já estava psicologicamente preparado para que nunca mais voltássemos a nos falar ou nos entender.
Foi quando, um dia depois de muitos meses, minha mãe voltou da papelaria com um recado:

“Filho, o Agner disse que se você não estiver fazendo nada, vá lá, ele quer te ver”.

Fiquei surpreso, em pânico e ao mesmo tempo extasiado. O que é que ele queria comigo depois de quase um ano? Minha mãe então continuou:

“Filho, um conselho meu: Vá desarmado, deixe a sua raiva pra trás. Se ele te chamou depois de todo esse tempo é porque ele quer conversar!”

Eu fui. Cada passo até a papelaria era como pisar em brasas descalço. Eu sinceramente não sabia o que me esperava ou qual seria a reação, tanto dele quanto a minha.
Cheguei na porta da loja e ele estava no balcão, cabeça baixa, fazendo contas. Parei e o fiquei observando por um tempo, sem coragem de chamar-lhe a atenção. Ele então ergueu os olhos e me percebeu lá. Me olhou com uma expressão de apreensão. Dei um passo e entrei na loja sério, cheguei ao balcão e estendi a mão:

“_Agner?”

Ele apertou a minha mão, sorriu de imediato e levou a outra aos meus cabelos:

“_E esse cabelinho heim? Ta mudado! Ficou da hora! Estiloso! Fez luzes?”

O que eu achei interessante da reação dele foi o fato de ele não ter desmanchado o meu cabelo, como ele sempre fazia, mas sim, quase que alisado, como um irmão que não vê o outro há muito tempo.
De repente não havia mais nada a ser dito, não havia mais nada do que reclamar. Estávamos ali conversando como dois velhos amigos, como se nunca tivéssemos nos afastado, contudo uma coisa estava diferente:
Aquela gana, aquela obsessão, aquela idolatria e ciúme insanos que eu tinha por ele, de repente haviam sumido e dado lugar a algo mais puro, mais saudável. É como se a coisa tivesse se tornado exatamente como deveria ter sido desde o início. Dois amigos conversando, sem esperar nada demais um do outro.

Dizem que as amizades verdadeiras duram para sempre, independente do tempo ou das coisas que aconteçam seja com uma parte ou outra. Dizem também que o tempo cura todas as feridas e que a distância as vezes trás mais benefícios do que a proximidade. Hoje ele cresceu bastante. Eu o vi passar de um garotinho de periferia amante do RAP para um rapaz responsável, estudioso e dedicado no que faz. Com um bom emprego, bons relacionamentos e projetos pro futuro.
Atualmente nos vemos bem pouco. Apesar de estarmos morando ainda nos mesmos lugares, a correria da vida nos afastou naturalmente, contudo, hoje eu o considero e sei que ele faz o mesmo, bem mais do que antes. Mesmo sem vê-lo, mesmo sem nos falarmos com freqüência, nossa amizade apenas aumentou e melhorou. Frases do tipo “você é pra mim como um irmão” e “não há o que eu não faça por você”, são comuns nas nossas conversas no MSN.

Ele está sempre preocupado em saber como estou, sempre tentando levantar o meu astral e recomendando meus trabalhos pros clientes dele (ele faz manutenção em computadores).
Outro dia mesmo eu estava falando com ele sobre o quanto tudo o que houve nos fez bem, nos amadureceu e fortaleceu ainda mais os nossos laços. Ele concordou.
As vezes ainda tentamos marcar de sair, mas com a vida corrida que ele vem levando, fica complicado, mas sinceramente não me importa. O simples fato de ouvir frases do tipo “Você é como um irmão pra mim” e “eu gosto de você pra caralho”, já me faz ganhar o dia. Pena que nem todos compreendem.

Dedico esse post ao meu amigo, ao meu irmãozinho, ao garoto que eu estou vendo com orgulho se tornar um homem. Não importa para que lado a vida nos leve, por quanto tempo fiquemos sem nos ver, uma parte dele vai estar sempre comigo. E sei que isso é recíproco.


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1 Divagações

  1. Bom ver um texto seu falando de coisas boas!! Não acho que você só fale mal de tudo. Na verdade, você se foca mais no ruim do que no bom. Mas isso é uma tendência humana, na minha mera opinião anonima, rs.
    Definitivamente, o tempo e a distância foram decisivos pra esse 'final feliz'.
    Seria bom se você conseguisse levar todas as suas relações de amizade pra esse mesmo caminho, sem que claro, fosse preciso uma briga ou mal-estar no meio disso tudo.
    Eu espero que um dia você consiga :)

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