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Sobre seguir moderadamente com a correnteza, geladeiras obrigatoriamente brancas e uma possível ingratidão hereditária.

domingo, 2 de agosto de 2015


Então, depois de tantos contratempos finalmente aconteceu. Trinta e oito anos depois da data em que fui expelido pela minha mãe do interior de seu útero nós estamos separados por uma relativamente longa distância. Ela finalmente se mudou, no último dia 31 de julho, para o apartamento que ganhou há meses atrás do programa de governo Minha casa, minha dívida, o qual, convenhamos, já foi melhor.
Dizer que estamos os três 100% felizes por isso ter acontecido não é verdade. Tudo bem, é um acontecimento, uma mudança de vida para todos nós, que sempre vivemos grudados um no outro. Por um lado essa separação vai ser boa, pois embora família, cada um de nós tem suas necessidades, anseios e jeito de ser e estando mais separados talvez consigamos lidar melhor com nossas vidas particulares. Continuo morando com minha tia, mas o fato é que ela nunca foi um problema, desde sempre foi um ser humano fácil de lidar e com a cabeça muito no lugar, enquanto minha mãe, com suas tentativas de suicídio, sua depressão e sua pouca humildade, sempre complicou as coisas e deixou o clima pesado entre nós. Não a considero uma pessoa ruim, apenas problemática demais. Por outro lado, a verdade é que não temos condições financeiras de arcar com uma mudança dessa magnitude no momento e sabe-se lá quando é que teríamos. Obcecada pela mudança, minha mãe, que nunca planejou nada direito em sua vida, não parou pra pensar o quão custoso financeiramente tudo isso vai ser pra todos nós. Ela não sabe controlar seus gastos pessoais e está devendo pra Deus e todo mundo. E agora com essa mudança terá que arcar com mais dívidas ainda, pagar o carreto da mudança comprar algumas coisas que vão lhe faltar etc. A começar por uma geladeira, uma espécie de "eletrodoméstico" que mantém alimentos frios e conservados por mais tempo, pois ela insistiu em se mudar sem ter uma geladeira. E por conta de sua extrema falta de humildade ela não quer uma usada, tem que ser nova e tem que ser branca, para combinar com sua nova moradia. E todos sabemos que uma geladeira nova, mesmo o modelo mais barato não vai sair por menos de R$ 950,00.

Ela já está há dois dias no apartamento, mas, sem uma geladeira fica impossibilitada de estocar alimentos. Não podemos lhe comprar nada, pois ela não tem como manter conservado. Também está sem um armarinho de cozinha, o que complica ainda mais sua situação. Uma de suas irmãs tem lhe levado comida pro almoço e no domingo ela vai almoçar na casa de outra, que mora lá perto, mas mesmo assim é um transtorno pra ela e com certeza para as irmãs, que acredito, mais a ajudam por piedade do que por amor fraterno. Nunca fomos uma família que se deu bem. Já estou prevendo que essa história da geladeira nova vai acabar sobrando pra mim. Se ao menos ela aceitasse algo usado, mas nessa altura não estou mais disposto a obrigá-la a nada. Estou cansado, abatido e irritado, com o trabalho, com os estudos, minha vida e minha saúde, que está boa graças aos céus, mas já foi melhor. Não tenho ninguém próximo com quem possa de fato sair e desabafar verdadeiramente e tenho uma série de outros problemas e angústias pessoais os quais não posso contar pra ninguém, pois aprendi com a convivência com outros seres humanos que, por mais que as pessoas te digam que entendem seus problemas, elas nunca os entendem de fato. Estou de saco escrotal cheio de pessoas que ficam me dizendo a todo o momento "pode contar comigo para o que precisar", mas que não entram em contato comigo se eu não fizer isso primeiro e que acham que, só porque você está indo trabalhar todos os dias, indo às aulas, comendo e respirando, fazendo "check-ins" nos lugares que você vai, você está bem emocionalmente. Não preciso de pessoas que curtam as coisas que eu posto nas redes sociais, preciso de pessoas dispostas a serem para mim o que eu preciso delas. Lógico que sei que todo mundo tem seus próprios problemas pra resolver e sua vida pra viver, mas cada pessoa tem uma natureza e a minha é essa: sentir falta de pessoas mais próximas a mim. Errado ou certo, esse sou eu. Dane-se sua opinião sobre mim ou seu julgamento. Talvez eu seja tão mal agradecido aos outros quanto minha mãe é, posso ter herdado isso dela, talvez não. Se serve de consolo para você, que não concorda com meu jeito de ser, eu já sofro o bastante pensando sobre isso, julgo e condeno a mim mesmo em várias ocasiões. 


Chegar em casa na sexta-feira a noite e não encontrar ninguém, assistir TV sozinho, jantar sozinho, todo o silêncio dominante, confesso, foi estranho, mas eu meio que já esperava por essas sensações, me conheço bem e antecipo com facilidade o que vou sentir ou como vou reagir às diferentes situações que possam se apresentar à mim. No sábado de manhã fui ao apartamento pela primeira vez, verificar se minha mãe tinha passado bem a primeira noite, levar algumas coisas pra ela e obviamente conhecer o lugar. O apartamento é "ok", arejado, bem pintado, com espaço suficiente pra uma única pessoa residir, feito com materiais de péssima qualidade, a pia do banheiro é do tamanho do meu cu, mas o lugar é ok, confesso. Se as coisas derem certo, se ela cuidar bem do lugar, administrar melhor suas finanças e acima de tudo cuidar de si mesma, as coisas podem dar certo pra ela. Nos próximos meses vamos os três passar muitos, muitos apertos mesmo por conta de todas as coisas que já disse nessa e em outras postagens, mas somos obrigados a passar por isso querendo ou não. As coisas vão mudar daqui pra frente e só nos resta deixar a correnteza ir levando o nosso barco, com a gente remando pra tentar recobrar o controle, manobrando aqui e ali, tomando cuidado pra não sermos jogados contra pedras muito grandes. É isso. Beijos ardentes à todos. Mandem nudes.


EDUARDO MONTANARI
Virginiano, bauruense, estudante de Design, ilustrador e web designer. Amante de cinema, quadrinhos, boa música e outras nerdices. Sonhando com o namorado ideal.



2 Divagações

  1. Como está sendo essa nova etapa da sua vida? No começo é estranho mesmo, mas depois se acostuma. Eu, quando fui morar sozinho, também levei um choque, tive que me conformar com o silêncio, com a solidão...Sua mãe deve ser igual ao meu pai, uma boa pessoa, mas difícil de lidar, problemática demais. Para ele o mundo tem que girar ao seu redor. O diferente é que ele é mais "mão de vaca" e não gosta de gastar kkkk.
    Como vc disse, ninguém vai entender nossos problemas, a não ser nós mesmos. Pelo que pude perceber, vc carrega um grande peso nas costas, já que vc é o "homem da casa" e isso tem sugado um pouco suas forças. Não sou ninguém pra te julgar ou questionar e compreendo essa sua angústia e essas responsabilidades.
    No mais, achei engraçadas algumas partes do seu texto. Apesar de todos os problemas, vc ainda possui uma veia cômica :) Isso é bom, alivia um pouco a dor. Abraços e nudes nem pensar kkkkk

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    1. Pois é. Todos teremos que nos acostumar. Minha tia, por exemplo, está muito nervosa com tudo isso, pois ganha pouco e sabe que terá muitos gastos. Eu também. Mas é lógico, não deixaremos de ajudar minha mãe. De minha parte, vou ter que praticar fazer menos café (rsrsrs), pois fazia para três pessoas.
      Quanto a essa minha comicidade, eu acredito que seja assim justamente por causa da carência também. Tento parecer engraçado para chamar mais a atenção das pessoas, fazer elas gostarem mais de mim, me acharem legal e divertido. As vezes não adianta muito, mas ruim não é. As vezes é melhor levar algumas coisas de forma divertida, mesmo que elas não sejam tanto, na realidade.

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