Amizade
Sobre frutos podres, comportamentos venenosos, gatilhos mentais e incentivo incondicional.
segunda-feira, 24 de junho de 2024
“Você não tem amigos aqui.”
“Você é esquisito, ninguém gosta de você.”
“Você não tem amigos Eduardo. Ninguém gosta de você. As pessoas se aproveitam de você, da sua ingenuidade e da sua burrice.”
“Você é um ermitão. Não tem amigos, não conversa com ninguém, não conhece ninguém.”
Algumas vezes você passa tanto tempo escutando as mesas coisas, recebendo o mesmo tipo de mensagem, mesmo que de formas diferentes e em épocas diferentes de sua vida, que acaba assimilando como verdade incontestável. E mesmo que ao longo do caminho aconteçam coisas e surjam pessoas em sua vida para lhe provar o contrário, te mostrar que você é querido, que é alguém que vale a pena e que não está de fato sozinho, as sementes plantadas ao longo de anos, desde que a sua mente ainda era jovem e flexível ficam lá, gerando frutos podres, gatilhos que são acionados ao menor sinal, com um olhar diferente, uma palavra, uma frase.
Quando ainda era pequeno, fui à uma festa de aniversário com uma tia e duas primas, suas filhas. Já não me lembro mais a data exata e nem quem era o aniversariante, um coleguinha das meninas talvez. Me lembro vagamente do local, um salão de festas pequeno, talvez em uma igreja, uma longa mesa farta com todas aquelas guloseimas tradicionais de aniversário e muitas crianças ao redor dela e brincando pelos arredores.
A certa altura da festa eu, mesmo muito tímido, estava conversando com um outro menino que estava do outro lado da mesa, coisa de um metro de distância. Não me lembro sobre o que conversávamos, mas estávamos bem entrosados, então ele me chamou para ir do outro lado da mesa, ficar junto dele e depois brincar no salão. Eu fiquei bastante empolgado, mas respondi que teria que pedir pra minha tia, ver se ela permitia, o que eu tinha certeza que iria acontecer.
Me virei pra ela e animado, perguntei se eu poderia ir logo ali, do outro lado da mesa para ficar com meu amigo, na certeza absoluta que ela permitiria. Entretanto, pra minha surpresa ela me olhou brava e disse: "Você não vai. Você não tem amigos aqui!".
Minha primeira reação foi um misto de surpresa e medo. Até aquele momento da minha vida, somente a minha mãe tinha erguido a voz pra mim, ficado brava. E na minha cabeça, somente ela poderia fazer isso, afinal era minha mãe. Ver uma de minhas tias falar comigo naquele tom, me repreender daquela forma e por um motivo tão pífio, me assustou, acho que a palavra que define é essa. Alguns segundos depois veio a mágoa, afinal, o foi que eu havia feito? O que eu havia pedido de tão absurdo? Simplesmente ir de um lado da mesa ao outro. Depois disso perdi totalmente a vontade de estar lá, de estar com aquelas pessoas as quais pra mim, do nada, se tornaram completas desconhecidas. Falo de minha tia e minhas primas. De repente, depois disso eu não estava lá com elas, não estava para me divertir, festejar, compartilhar nada com ninguém. Era apenas um menino sozinho em meio a uma multidão de crianças e adultos indiferentes à minha existência.
Na escola não era diferente, tanto no ginásio quanto já na minha adolescência, no colégio. Nunca fui de me enturmar ou fazer grupos de amigos. Tive uns aqui, outros ali, mas foram períodos curtos.
Sofri muito bullying por parte dos colegas. Crianças e adolescentes podem ser muito cruéis se desejarem, propositalmente. É incrível como uma criança sabe exatamente onde atingir a outra quando quer. Acho que é daí que vem o meu ranço por crianças hoje em dia. Ou são completas idiotas mimadas pelos pais ou pequenos demoniozinhos, replicando o comportamento venenoso de seus genitores.
Passei anos seguidos ouvindo coisas como: "Nossa! Você é feio de dar pena! Quatro-olhos, dentes tortos. Você é esquisito, estranho, nenhuma menina vai querer te namorar, te beijar, ninguém gosta de você"!
O ápice da minha vida escolar foi ter um cartaz de "ME CHUTE" colado nas costas sem que eu percebesse, durante o intervalo. Colado por uma garota que eu considerava uma de minhas melhores amigas na época.
Quando você cresce dessa forma, ouvindo esse tipo de coisa dos parentes, colegas de escola, estranhos até, tem a esperança de conseguir algum conforto e apoio das principais pessoas pra você, as mais importantes: seus pais. Ou em casos como o meu, de sua mãe, o único ser humano na Terra o qual uma criança pode confiar de que terá apoio e incentivo incondicionais. Entretanto muitos pais antes de serem pais, não nos esqueçamos, são humanos, falhos, confusos e também carregando traumas de infância nunca resolvidos.
Já escrevi aqui sobre um "amigo" de juventude com o qual estudei, que com o passar do tempo se mostrou uma pessoa bastante problemática. Eu na verdade era mais amigo do irmão mais novo do que dele mesmo, e o rapaz percebia isso. Não demorou para começar a me tratar mal, me humilhar, me diminuir e me agredir de todas as formas possíveis, inclusive fisicamente.
Quando minha mãe finalmente se cansou dessa situação, me obrigou a terminar a amizade com esses irmãos e nunca mais procurá-los. E apesar de sofrer nas mãos do irmão mais velho, na época achei essa decisão bastante radical e durante uma caminhada, questionei minha mãe se não poderíamos resolver tudo com uma conversa franca, afinal um dos irmãos era muito meu amigo, ou pelo menos assim eu o considerava.
Furiosa, sua resposta, aos berros, no meio da rua foi a seguinte: “Você não tem amigos Eduardo. Ninguém gosta de você. As pessoas se aproveitam de você, da sua ingenuidade e da sua burrice”.
Se ouvir aquilo, vindo da minha própria mãe, me doeu? Vocês não fazem ideia.
Quando ouvir esse tipo de coisa se torna algo constante, sem perceber você passa a repetir isso como um mantra em sua mente. "Não tenho amigos, ninguém gosta de mim, eu não valho a pena".
Ontem, mais uma vez ouvi algo semelhante, dessa vez vindo de minha tia, a quem considero minha segunda mãe: “Você é um ermitão. Não tem amigos, não conversa com ninguém, não conhece ninguém".
Apesar do tédio clássico de domingo, eu estava bem até então, planejando sair no fim do dia e ver um amigo que de tempos em tempos vem à cidade. Me arrumar bem bonito, um bom banho, talvez me perfumar e ter um fim de dia agradável, com boa conversa e boa companhia. Mas é incrível como algumas poucas palavras dela conseguiram minar tudo de bom que eu estava sentindo até então, o gatilho foi acionado. Será mesmo que eu tenho os amigos que penso que tenho, mesmo poucos? Será que eles realmente gostam de mim ou sentem apenas pena? Vou morrer sozinho.
Claro que a noite foi péssima, pois perdi totalmente o foco, a vontade de interagir. Meu amigo também não estava bem psicologicamente e isso só serviu pra piorar as coisas, pois acabei isolado na festa enquanto ele me deu pouca atenção, preferindo ficar próximo de outros amigos os quais, talvez, lhe fizessem um bem maior naquele momento. Não o culpo e nem acho que tenha sido intencional, mas não vou negar que só serviu pra piorar tudo.
E agora estou aqui, começando mais uma semana sem ânimo ou qualquer vontade de interagir, acreditando um pouco mais que não valho a pena, que não tenho de fato amigos que se importem e que talvez, como acontece com muitos, viva uma vida solitária e morra de forma igual.
“Você é esquisito, ninguém gosta de você.”
“Você não tem amigos Eduardo. Ninguém gosta de você. As pessoas se aproveitam de você, da sua ingenuidade e da sua burrice.”
“Você é um ermitão. Não tem amigos, não conversa com ninguém, não conhece ninguém.”
Algumas vezes você passa tanto tempo escutando as mesas coisas, recebendo o mesmo tipo de mensagem, mesmo que de formas diferentes e em épocas diferentes de sua vida, que acaba assimilando como verdade incontestável. E mesmo que ao longo do caminho aconteçam coisas e surjam pessoas em sua vida para lhe provar o contrário, te mostrar que você é querido, que é alguém que vale a pena e que não está de fato sozinho, as sementes plantadas ao longo de anos, desde que a sua mente ainda era jovem e flexível ficam lá, gerando frutos podres, gatilhos que são acionados ao menor sinal, com um olhar diferente, uma palavra, uma frase.
Quando ainda era pequeno, fui à uma festa de aniversário com uma tia e duas primas, suas filhas. Já não me lembro mais a data exata e nem quem era o aniversariante, um coleguinha das meninas talvez. Me lembro vagamente do local, um salão de festas pequeno, talvez em uma igreja, uma longa mesa farta com todas aquelas guloseimas tradicionais de aniversário e muitas crianças ao redor dela e brincando pelos arredores.
A certa altura da festa eu, mesmo muito tímido, estava conversando com um outro menino que estava do outro lado da mesa, coisa de um metro de distância. Não me lembro sobre o que conversávamos, mas estávamos bem entrosados, então ele me chamou para ir do outro lado da mesa, ficar junto dele e depois brincar no salão. Eu fiquei bastante empolgado, mas respondi que teria que pedir pra minha tia, ver se ela permitia, o que eu tinha certeza que iria acontecer.
Me virei pra ela e animado, perguntei se eu poderia ir logo ali, do outro lado da mesa para ficar com meu amigo, na certeza absoluta que ela permitiria. Entretanto, pra minha surpresa ela me olhou brava e disse: "Você não vai. Você não tem amigos aqui!".
Minha primeira reação foi um misto de surpresa e medo. Até aquele momento da minha vida, somente a minha mãe tinha erguido a voz pra mim, ficado brava. E na minha cabeça, somente ela poderia fazer isso, afinal era minha mãe. Ver uma de minhas tias falar comigo naquele tom, me repreender daquela forma e por um motivo tão pífio, me assustou, acho que a palavra que define é essa. Alguns segundos depois veio a mágoa, afinal, o foi que eu havia feito? O que eu havia pedido de tão absurdo? Simplesmente ir de um lado da mesa ao outro. Depois disso perdi totalmente a vontade de estar lá, de estar com aquelas pessoas as quais pra mim, do nada, se tornaram completas desconhecidas. Falo de minha tia e minhas primas. De repente, depois disso eu não estava lá com elas, não estava para me divertir, festejar, compartilhar nada com ninguém. Era apenas um menino sozinho em meio a uma multidão de crianças e adultos indiferentes à minha existência.
Na escola não era diferente, tanto no ginásio quanto já na minha adolescência, no colégio. Nunca fui de me enturmar ou fazer grupos de amigos. Tive uns aqui, outros ali, mas foram períodos curtos.
Sofri muito bullying por parte dos colegas. Crianças e adolescentes podem ser muito cruéis se desejarem, propositalmente. É incrível como uma criança sabe exatamente onde atingir a outra quando quer. Acho que é daí que vem o meu ranço por crianças hoje em dia. Ou são completas idiotas mimadas pelos pais ou pequenos demoniozinhos, replicando o comportamento venenoso de seus genitores.
Passei anos seguidos ouvindo coisas como: "Nossa! Você é feio de dar pena! Quatro-olhos, dentes tortos. Você é esquisito, estranho, nenhuma menina vai querer te namorar, te beijar, ninguém gosta de você"!
O ápice da minha vida escolar foi ter um cartaz de "ME CHUTE" colado nas costas sem que eu percebesse, durante o intervalo. Colado por uma garota que eu considerava uma de minhas melhores amigas na época.
Quando você cresce dessa forma, ouvindo esse tipo de coisa dos parentes, colegas de escola, estranhos até, tem a esperança de conseguir algum conforto e apoio das principais pessoas pra você, as mais importantes: seus pais. Ou em casos como o meu, de sua mãe, o único ser humano na Terra o qual uma criança pode confiar de que terá apoio e incentivo incondicionais. Entretanto muitos pais antes de serem pais, não nos esqueçamos, são humanos, falhos, confusos e também carregando traumas de infância nunca resolvidos.
Já escrevi aqui sobre um "amigo" de juventude com o qual estudei, que com o passar do tempo se mostrou uma pessoa bastante problemática. Eu na verdade era mais amigo do irmão mais novo do que dele mesmo, e o rapaz percebia isso. Não demorou para começar a me tratar mal, me humilhar, me diminuir e me agredir de todas as formas possíveis, inclusive fisicamente.
Quando minha mãe finalmente se cansou dessa situação, me obrigou a terminar a amizade com esses irmãos e nunca mais procurá-los. E apesar de sofrer nas mãos do irmão mais velho, na época achei essa decisão bastante radical e durante uma caminhada, questionei minha mãe se não poderíamos resolver tudo com uma conversa franca, afinal um dos irmãos era muito meu amigo, ou pelo menos assim eu o considerava.
Furiosa, sua resposta, aos berros, no meio da rua foi a seguinte: “Você não tem amigos Eduardo. Ninguém gosta de você. As pessoas se aproveitam de você, da sua ingenuidade e da sua burrice”.
Se ouvir aquilo, vindo da minha própria mãe, me doeu? Vocês não fazem ideia.
Quando ouvir esse tipo de coisa se torna algo constante, sem perceber você passa a repetir isso como um mantra em sua mente. "Não tenho amigos, ninguém gosta de mim, eu não valho a pena".
Ontem, mais uma vez ouvi algo semelhante, dessa vez vindo de minha tia, a quem considero minha segunda mãe: “Você é um ermitão. Não tem amigos, não conversa com ninguém, não conhece ninguém".
Apesar do tédio clássico de domingo, eu estava bem até então, planejando sair no fim do dia e ver um amigo que de tempos em tempos vem à cidade. Me arrumar bem bonito, um bom banho, talvez me perfumar e ter um fim de dia agradável, com boa conversa e boa companhia. Mas é incrível como algumas poucas palavras dela conseguiram minar tudo de bom que eu estava sentindo até então, o gatilho foi acionado. Será mesmo que eu tenho os amigos que penso que tenho, mesmo poucos? Será que eles realmente gostam de mim ou sentem apenas pena? Vou morrer sozinho.
Claro que a noite foi péssima, pois perdi totalmente o foco, a vontade de interagir. Meu amigo também não estava bem psicologicamente e isso só serviu pra piorar as coisas, pois acabei isolado na festa enquanto ele me deu pouca atenção, preferindo ficar próximo de outros amigos os quais, talvez, lhe fizessem um bem maior naquele momento. Não o culpo e nem acho que tenha sido intencional, mas não vou negar que só serviu pra piorar tudo.
E agora estou aqui, começando mais uma semana sem ânimo ou qualquer vontade de interagir, acreditando um pouco mais que não valho a pena, que não tenho de fato amigos que se importem e que talvez, como acontece com muitos, viva uma vida solitária e morra de forma igual.