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Sobre mineiros soterrados, cabelinhos de anjo, matrimônios e sorrisos nas janelas dos ônibus.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Quando a gente é criança e "acha" que entende o mundo e as coisas dele a nossa mãe sempre diz: "Um dia quando você for mais velho, vai entender". Na hora a gente nem liga, como sempre achamos que nada temos a aprender e que conseguiremos lidar com seja o que for que apareça na nossa frente. Não sei porque comecei o texto assim. Talvez porque somente hoje, depois de "adulto", finalmente esteja percebendo o quanto o mundo é maior do que eu pensava e as pessoas e o espiríto humano são tão mais significativos do que se pode mensurar.



Outro dia estava vendo na TV uma reportagem sobre aqueles mineiros que foram enterrados vivos no Chile há mais de três semanas. Três semanas e somente agora foi que eu "me toquei" disso. Não que eu possa fazer alguma coisa pra ajudá-los, mas é gozado pensar que só depois de três semanas é que eu realmente prestei verdadeira atenção ao que houve. Vivemos uma vida tão atribulada, correndo atrás de nossos sonhos, lamentando nossos próprios problemas, além do fato de que hoje em dia tragédias se tornaram tão naturais pra nós, tão parte de nosso cotidiano que acabamos encarando tudo como "apenas mais uma coisa ruim que aconteceu" no meio de tantas outras.
Pela primeira vez após três semanas do acidente prestei atenção ao que houve e um mal estar tomou conta de mim enquanto jantava meu delicioso macarrão "cabelinho de anjo" sentado no meu confortável sofá tomando um copo de guaraná Antarctica ®.
Geralmente quando ocorre um terremoto ou um desabamento, quando há sobreviventes, estamos acostumados a vê-los ser resgatados em algumas horas, dias, mais tardar uma semana. Mas esse caso me chamou a atenção não só pelo tempo em que eles já estão lá, mas também pela previsão do tempo em que eles ainda permanecerão lá embaixo, enterrados vivos, sobrevivendo como puderem, com um mínimo de ajuda. Vi na reportagem que a previsão incial de resgate dos mineiros era só pra daqui quatro meses, quatro meses! Seres humanos que já estão passando pela pior experiência de suas vidas, enterrados vivos há mais de três semanas e agora ainda vão passar meses presos até poderem ser resgatados. Vi na reportagem que a previsão de resgate caiu de quatro para dois meses. Ao mesmo tempo em que é uma ótima notícia, ainda assim causa um aperto no coração saber que aqueles homens ainda ficarão 60 dias soterrados esperando ajuda.
Contudo os noticiários informam que eles estão relativamente bem. Conseguiram superar as crises de diarréia e parece que estão se alimentando melhor, pois estão conseguindo receber alimentos mais calóricos enviados por um pequenino túnel feito para ajudá-los.
As vezes eu não me entendo. Odeio algumas pessoas, tenho mágoa de outras, mas consigo me comover com o drama de pessoas as quais nem conheço, nunca conhecerei e que tecnicamente são irrelevantes pra mim. Seria verdade então a mensagem que tenta nos passar o filme Avatar? Todos estamos ligados entre nós e com o mundo? Mesmo que tentemos evitar, o que afeta um de nós, direta ou indiretamente afeta todos em maior ou menor grau?


O casamento de uma de minhas melhores amigas é no próximo mês e eu sinceramente estou entre a cruz e a espada, acho que todos sabem porque. Histórias de casais felizes nunca foram as minhas preferidas desde que passei a perceber o quanto sinto falta disso. Acompanhar a história de felicidade dos outros, enquanto eu não consigo ter a minha própria é uma coisa que me deixa doente. A última festa de casamento que fui, o fiz unicamente pelo pesseio, boa comida e principalmente pra estar perto da pessoa que já considerei o melhor dos amigos (na verdade acho que esse último motivo é que foi o "unicamente"). Prestigiar os noivos, sua história de felicidade e lhes desejar amor eterno não foi nem de longe minha vontade.


O problema agora é que quem vai se casar é uma pessoa que para mim é como uma irmã. E nesse caso não sou apenas eu que a considero como tal, como geralmente faço erroneamente com a maioria dos amigos que conheço, mas ela também nutre por mim o mesmo afeto, já tendo me dito isso várias vezes pessoalmente, tanto é assim que ela diz que o filho que ela espera do noivo é praticamente um sobrinho meu, o que me deixa absurdamente emocionado e feliz. Eu, tio de alguém, imaginem só.
Talvez alguns acreditem que estou sendo falso, talvez não, pouco me importa, mas o fato é que estou realmente feliz por ela, pelo casamento e pelo filho que ela espera, com o qual tanto sonhou, só que o fato é que independente disso, a felicidade alheia continua me fazendo mal. Eu fico feliz por ela, mas não consigo deixar de ficar triste por mim, por ver que os anos estão passando, todas as pessoas ao meu redor estão se acertando, achando seus caminhos, seus companheiros e companheiras e eu continuo aqui e continuarei sabe-se lá por mais quanto tempo. Me sinto como se estivesse parado num ponto de ônibus esperando pra embarcar junto com as pessoas e seguir em frente com elas, mas cada ônibus que passa não para no ponto e eu fico olhando ele sumir na esquina, com os rostos de pessoas conhecidas aparecendo nas janelas, sorrindo.
Minha prima me diz e eu concordo com ela, que em alguns casos devemos engolir nosso orgulho, nosso egoísmo e fazer por merecer o amor que recebemos de algumas pessoas. Por mais que eu não goste de estar com casais, de presenciar os momentos de felicidade deles, em alguns casos específicos é preciso tentar, talvez não superar, mas pelo menos encobrir isso temporariamente em nome de uma coisa maior. A consideração que ela tem por mim é justamente a que eu vivo procurando em muitas pessoas que não me dão. Alguém que me considera mais que um simples amigo, mas um irmão com quem pode contar e com quem eu sei que posso contar.
E quando eu digo "encobrir" o que me incomoda, não é mascarar a coisa de maneira falsa, não é ser falso, estar lá apenas para agradá-la, enquanto eu mesmo estou sendo dilacerado por dentro, mas sim, pelo menos por alguns momentos, guardar todo esse sentimento destrutuvo num canto do meu coração e deixar ele lá, como eu disse, em nome de algo maior e mais válido.





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4 Divagações

  1. Eduardo, cuidado pra não se deixar enganar pelas aparências. Acredito que na grande maioria das vezes os casais "aparentemente" felizes apenas se suportam por medo de ficar sozinho. Acumulam ressentimentos, brigam quando estão a sós, etc. É muito difícil vc encontrar quem esteja realmente feliz com o parceiro. A maioria tem muitas queixas do outro. Talvez vc esteja diante de casais que "parecem" felizes e o único genuinamente feliz nessa história toda é você.

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  2. Sobre os mineiros "enterrados vivos":
    É incrível como com tanta tecnologia no séc. XXI terão que esperar todo esse tempo para (tentar) resgatá-los. Eu já teria morrido de claustrofobia e pânico total.
    Beijos, muitos!

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  3. Ai, sem comentários sobre os mineiros... vc já disse tudo. Mas eu sabia que vc era legal..kkkk.. corajoso e verdadeiro! Eu falo nem metade do que tenho vontade em meu blog e já levo cacetada, imagine se falasse tudo o que vc tem coragem? O post sobre a velhice; o povo já levou para o lado de que não gosto dos velhinhos!! kk.. eu tb já disse que sempre há alguém para amar, nesse caso, não é diferente contigo. Abração e tenha um bom dia.

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  4. Essa história dos mineiros, realmente é algo muito estranho, como que em um mundo com tecnologia tão avançada, tantas coisas novas inventadas, não é capaz de tira-los de lá? Esperar por tanto tempo, colocando em risco a saúde física e mental dessas pessoas, sinceramente não consigo entender.
    Casamento, eu acho bonito, mas não é algo que eu quero para mim, eu gosto de ter alguem ao meu lado, mas sou mais a favor do 'sozinho'. Não que eu não goste de me relacionar, ao contrário, acho que todos devem ter sim um relacionamento, mas muitas vezes é melhor ficar 'sozinho', do que sustentar uma máscara de 'casal feliz'. Enfim, não vou continuar, senão vai virar um texto isto daqui..

    Beijos.

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