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Sobre a fome de crianças esqueléticas, planos frustrados de cinema, montanhas russas atordoantes e estranhos ruídos estomacais.

domingo, 20 de maio de 2012

Eu sei que a vida não é uma coisa estável, ela é composta de períodos bons e ruins.  Os ruins geralmente ou são consequência das nossas próprias cagadas ou são situações que estão além do nosso controle, mas às vezes eu acho que por mais que nós mesmos criemos situações para nos foder, todo o resto que está fora do nosso controle é a parte maior disso tudo. Em pouco menos de um ano me aconteceram tantas coisas, uma seguida da outra, que eu ainda agora estou atordoado. A vida de todas as pessoas é como estar andando em uma montanha russa, acredito que não haja exceções, mas às vezes eu gostaria que essa sensação horrorosa que dá quando você vai descer com tudo, quando você sente o estômago ir à garganta, parasse. Todo esse sobe e desce emocional está me fazendo sentir cada vez mais fraco. Você acaba ficando meio perdido, despreparado, não sabe qual é a hora certa de ficar feliz ou triste por alguma coisa. Num segundo você está comemorando, fazendo planos, seu otimismo está nas alturas, no outro algum imprevisto acontece e tudo aquilo que você pensou ser uma certeza some da frente dos seus olhos como quando acordamos de um sonho gostoso pela manhã, tentamos fechar os olhos novamente, voltar a dormir para continuar de onde paramos, mas somos irremediavelmente puxados para a realidade.
Em meio a todos os meus altos e baixos fico feliz em dizer que me apaixonei, conheci finalmente depois de trinta e cinco anos a sensação de se amar verdadeiramente alguém, mesmo que a distância. Pude entender pela primeira vez o sentimento que tanto critico, as canções de amor cafonas começaram a fazer sentido, as noites mal dormidas, a preocupação em saber se a outra pessoa está bem, foi novo e diferente pra mim, me senti estranho, esquisito, foi bom por um tempo experimentar a sensação de me preocupar com outra pessoa além de eu mesmo, mas experimentei também o peso da famosa frase “acho que devemos ficar só na amizade” e pude constatar o quanto isso só funciona se for de comum acordo. Confesso que não estou conseguindo lidar bem com isso até o presente momento, apesar de ter achado que a minha suposta maturidade daria conta do recado. Subestimei os meus sentimentos e agora me ferrei bacana. Mas é um daqueles muitos e comuns casos onde não lhe resta outra opção além de aceitar e seguir em frente. Seguir eu estou seguindo aos trancos e barrancos, aceitar talvez demore um tempo mais. Mas se tem uma coisa que aprendi é que o tempo remedia muitas coisas, espero então que acalme meu coração em relação a isso. Por hora eu só queria deitar e me desintegrar. Ah sim, voltei a odiar casais felizes. Procurem não ficar perto de mim.


O meu último sábado não foi um dia ruim, mas azarado, acho que esse é o termo que posso usar. Decidi de última hora ir ao cinema assistir A Batalha dos Mares, sessão das 14h15min. Coloquei minha melhor roupa, passei meu melhor perfume, peguei o meu Passe Deficiente, que me permite andar gratuitamente de ônibus e fui. Geralmente vou a pé, mas passei um perfume dos mais caros no pescoço e pulsos e não queria desperdiçar. Peguei duas conduções, pois nos finais de semana os ônibus aqui em Bauru circulam pouco, de uma em uma hora ou hora e meia, não queria perder a sessão.
Embora tenha saído do Colégio Técnico no ano de 2008, pude ficar com minha velha carteirinha de estudante e, talentoso no Photoshop como sou, fiz um excelente trabalho de falsificação aumentando sua validade até o final do ano de 2013. Todo mundo sabe que o lucro do cinema está na caixa de pipoca, que na maioria das vezes custa o equivalente ao preço da meia-entrada, então, eu como cidadão consciente quero exercer o meu direito de pagar um preço justo. No caso, o menor que eu conseguir.
Tenho ido ao cinema com essa carteirinha desde então, ninguém tem me importunado, tenho podido ver meus blockbusters preferidos economizando bons tostões, os quais, posso usar pra comprar os já corriqueiros para mim, pacote de pipoca ultra-blaster-mega-hyper-jumbo de 1 kg pra comer sozinho e uma modesta garrafinha de 600 ml de H2O sabor limão.
Para minha surpresa e total frustração, não, não descobriram que minha carteirinha é falsa, eu sou mais eu quando se trata de Photoshop e não faço qualquer lixo, mas ao chegar na boca do caixa fui informado que a nova gerência não está mais aceitando carteirinhas de cursinhos ou cursos técnicos, mas apenas de faculdade mesmo, de cursos superiores. O rapaz foi até simpático, me sugeriu ir me informar com a gerência do cinema, mas sabem quando você brocha geral? Pois é, eu sou o tipo de pessoa que na maior parte das vezes acha mais fácil desistir de uma coisa do que lutar por ela, além do que sou pessimista. Oras, se os caixas dizem que não aceitam carteirinha de curso técnico, obviamente foram instruídos pela gerência. Fora o fato de que ter que interagir demais com as pessoas me cansa. Duas, três frases no máximo já são o suficiente para mim. É por isso que eu ando sempre com meus fones de ouvido enfiados na orelha, mesmo que algumas vezes não tenha nada conectado a eles na outra ponta, sempre funciona, menos para os velhos é claro. Com minha sessão de cinema de A batalha dos Mares, literalmente naufragada, não vi outra opção a não ser ir ao Burger King. Comer coisas nada saudáveis podem não ajudar na sua saúde, mas aliviam pra caramba términos de relacionamento e frustrações cinematográficas.


Só um detalhe quanto ao Burger King, tá meus queridos: assim como em todas as redes de fast food, o lanche verdadeiro nunca é tão bonito quanto o do cardápio ou o que está piscando no luminoso, nem tão grande. Por outro lado tenho que admitir, é gostoso pra caralho. Natural, coisas pouco saudáveis são as mais gostosas. Um dia vou entender a lógica disso.
Tinha pensado em comer antes de ir ao cinema, pois saí de casa correndo, sem almoço, para chegar a tempo no shopping e estava realmente morto de fome. Tá, morto de fome é exagero, mortas de fome estão àquelas criancinhas esqueléticas lá da África, Somália e adjacências, mas eu estava com muita fome, tipo assim, salivando, coisa e tal, mas como eu vi que a fila para o pedido estava enorme e que talvez não desse tempo de eu entrar na sessão, decidi ir antes ao cinema. Contudo, depois da minha carteirinha ter sido sumariamente recusada, decidi subir novamente até a praça de alimentação e fazer o meu pedido.
Pedi então o meu combo básico de sempre: um lanche o qual não consigo lembrar o nome em meio a tantos (e sinceramente não faço a menor questão), um pacotinho de batatas fritas e um copo médio de refrigerante, onde mais da metade do conteúdo do mesmo eram só cubos de gelo. Bom, se contribuir pra deixar o refrigerante menos calórico já tá valendo, não que adiante de algo, estando você diante de um saquinho de fritas e um lanche.
Comi como um rei, ou melhor, como um king, mas só pra variar não foi uma experiência isenta de contratempos. O lugar estava lotado, demorei uns dez minutos na fila até poder fazer meu pedido, a vadiazinha do caixa não tinha dez centavos pra me dar de troco e meu estômago estava fazendo ruídos estranhos em público. Eu até diria que é constrangedor, mas aí lembro lá das criancinhas da Somália.
Pra esperar minha bandeja com o lanche foi só alegria, mais vinte minutos em pé, tendo que me encostar em outras pessoas, crianças gritando atrás de mim e pra melhorar, acabou o gás da máquina de refrigerantes e fora eu, tinham mais umas oito pessoas esperando seus combos... Com refri. Cadê refri?
A solução encontrada pelo estabelecimento foi entregar os lanches e pedir que os clientes voltassem pra pegar seus refrigerantes depois, e pra minha sorte esse depois não demorou mais do que dez minutos, possibilitando assim que eu degustasse os últimos dois nacos do meu lanche com uma bebidinha.
Como eu disse no começo, “situações fora do nosso controle”, elas sempre parecem mais constantes do que o normal. Pelo menos aprendi uma coisa nova hoje: máquinas de refrigerante são movidas a gás, seja lá que gás for esse.


Eduardo Montanari Sobre o Autor:
Eduardo Montanari é dono dos blogs Divagações Solitárias e Du-Montanari Design. É formado técnico em informática e trabalha como designer e web designer. Nerd assumido, gosta de quadrinhos, anime, mangá, entre outras nerdices e esquisitices.


5 Divagações

  1. Olha, desculpe, mas estou rindo um bocado das suas desventuras e também da sua desenvoltura. Assumir assim que falsifica carteirinha, isso é sério?

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    1. Estou fazendo um esforço mesmo para rir dos próprios problemas. Está difícil, mas não custa tentar. Quanto a carteirinha, sim, é verdade. Por que não?

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  2. Olá, Eduardo!
    No meu tribunal, estás mais do que absolvido, afinal a vida não está nada fácil - além do mais os preços já são altos pra isso mesmo!
    Abçs!
    Rike.

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  3. Oi,Eduardo
    Aqui em SP, se não me engano, faz um tempo que cursinho e cursos técnicos não são aceitos pra pagar meia no cinema. Só colégio e faculdade mesmo.

    Sim, essa sensação de descontrole da própria vida, de estar à beira da descida o tempo todo cansa e muito. Só quando eu consegui estabilizar e sentir um tempo de paz é que eu pude ver como isso é precioso na minha vida. Mas se manter longe da montanha russa é trabalho constante também. Mas vale a pena.
    Abçs e tudo de bom.

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  4. Edu,

    uma vez fui salva por um Burger King! nao aguentava mais comer hotdog alemão e dei de cara com uma loja desta! ufa! apesar de não suportar fast food, aprovei naquele momento!

    sobre amar, sonhar, suspirar, decepcionar, etc... precisamos sentir essas coisas de vez em quando, para não esquecermos que Deus nos deu o poder de amar e ser amado, mesmo que não seja como em contos de fadas.

    BEIJOS

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