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Sobre doenças terminais, anomalias da natureza, blasfêmia e telefones.

quarta-feira, 16 de junho de 2010


Em um de meus posts anteriores falei sobre como me sinto sufocado em ser obrigado a viver nesse mundo, nessa sociadade onde tudo é padronizado. Não usei exatamente esse termo, mas em meio às muitas coisas que escrevi quis dizer isso também. Depois disso continuei pensando a respeito do quanto tudo é tão absurdamente moldado de forma que a mais leve ondulação na água causa estranheza, em como se você não é igual a todo mundo, se não está no padrão que a sociedade exige, já é visto de forma incomum. 
Eu nunca tive pai, ou melhor, nunca conheci meu pai, afinal não nasci assim, do nada, por obra do espírito santo. 
Meu caso é comum como o de outras milhares de pessoas. Fruto de um relacionamento que no final não foi levado a sério. Coisas da juventude, acho que isso nunca vai mudar. O cara pulou fora assim que soube e a minha mãe, orgulhosa como ela só, decidiu que me criaria sozinha. 


Eu jamais senti falta de um pai, nunca perguntei por ele, pois a minha mãe pra mim era o meu mundo, era mais do que o suficiente. Pra falar a verdade até hoje nem sei o nome do sujeito. Isso sempre foi mais do que natural pra mim, tanto quanto comer e dormir. Nunca me faltou nada, tudo o que eu quis eu tive, na medida das possibilidades da minha mãe. A figura paterna nunca me fez falta. Contudo a sociedade, a mídia, os "bons costumes" sempre pregaram a idéia da família perfeita: Papai, mamãe, um casal de filhos, cachorro, reuniões de família aos domingos e tudo o mais. Pra mim isso sempre foi e é até hoje uma coisa irreal e dispensável
Só que, enquanto tudo isso para mim sempre foi perfeitamente natural, para os outros era como se fosse um caso de anomalia da natureza. Na escola, quando perguntado sobre o meu pai eu não me acanhava em dizer que não tinha um. Não ficava constrangido ou sem graça, simplesmente respondia a pergunta com a maior naturalidade possível para o espanto de todos. Me lembro que os colegas ficavam pasmos e inconformados: 


"_Mas como pode ser isso? Você não tem pai? Mas como é que você vive então? É mentira!"


Me lembro que ficava observando a reação dos amiguinhos e não conseguia entender tamanho choque. Qual era o problema de não se ter um pai? Algumas pessoas não tem uma bicicleta, outras nunca tiveram um cãozinho de estimação, já eu nunca tive um pai. Era tão anormal assim? 
Acho que, pensando agora, o meu asco pelo ser humano vem desde muito cedo, pois desde pequeno eu já conseguia perceber o quanto as pessoas podem ser limitadas e ridículas em seu raciocínio. E todas as vezes, em todas as escolas era a mesma coisa, o mesmo espanto. Quando eu falava que não tinha pai, que não conhecia e nunca me interessei, parecia que eu falava que tinha uma doença terminal. Olhavam pra mim como se eu fosse louco. 


Sempre fomos pessoas de poucas posses também. Como minha mãe cuidava de tudo sozinha, sempre vivemos de forma bem humilde, de aluguel ou morando de favor em alguma casa, como moro hoje. Coisas que eram comuns para outras pessoas, para nós eram um sonho distante, muito distante. Aparelhos de som, video-game, vídeo-K7, tudo isso para nós era artigo de luxo. Nem tanto porque eram coisas caras, mas porque sempre tivemos que escolher entre pagar as contas, comprar comida e roupas ou nos darmos a esses luxos. Uma linha de telefone para nós era uma coisa que na época era impensável de se ter. 
No colégio, quando algum amigo passava seu telefone, logo em seguida pedia o meu e eu como sempre, naturalmente respondia que não tinha, que nunca tive, a resposta e o espanto eram sempre os mesmos: 


"_Ah vá! Você tá me zuando né? Quem é que não tem um telefone hoje em dia? Impossível isso! Você só pode tá de brincadeira comigo!" 


Eu nunca consegui entender o que há de tão difícil em se entender que outra pessoa não tem um telefone, ou um vídeo K7 ou sei lá. 
Com o futebol e as garotas era a mesma coisa. Nunca escondi de ninguém, como não faço questão de esconder até hoje que jamais namorei, jamais beijei ninguém. Sempre fui um zero a esquerda no quesito garotas e pelo visto ainda sou. Tenho 34 anos e nem sequer já andei de mãos dadas com alguém. Tá, isso pra mim não é natural e nem tampouco tranqüilo, mas como sempre motivo de muito espanto, preconceito e piadinhas por parte das pessoas: 


"_Fala sério? Você tá de brincadeira? Você é bicha, anormal ou coisa assim?" 




Sempre o mesmo espanto, sempre o mesmo tudo. Numa rodinha de caras, quando eu falo abertamente que tenho verdadeiro nojo de futebol, que não vejo graça e que acho totalmente dispensável, as pessoas olham pra mim como se eu estivesse blasfemando. Como se, por ser brasileiro e pelo Brasil ser o país do futebol, eu tivesse a obrigação de ter um time e torcer por ele. 


"_Mas isso não pode! Você tem que ter um time!" 


O tempo passou, muitas coisas mudaram e outras não. Hoje, às custas de muito suor eu tenho meu telefone, pago a minha internet, comprei meu primeiro DVD no natal do ano passado e pasmem, tenho até um celular. Óia só, to me socializando do jeito que o povo gosta! Todavia continuo tendo nojo de futebol, continuo completamente e temo, irremediavelmente encalhado.
Vejo hoje que um pai faz falta. Talvez se eu tivesse uma figura paterna em minha vida seria completamente diferente do que sou hoje. Por outro lado penso que seria mais igual a todo mundo e me pego pensando se isso seria realmente bom. Eu vivo um dilema. Sempre me senti diferente de todos, mas também sempre odiei essa mesmice que é o mundo e as pessoas.

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6 Divagações

  1. Entendo vc...também fui criada cm apenas suficiente pra não morrer de fome,não tenho pai e não sou apaixonada por futebol hehehe

    Só na parte de namorar que eu nunca "passei trabalho" kkk (não sou bonita mas sempre dei sorte hihihi)...

    O jeito é ignorar esse povo que pensa que a vida de todos precisa ser como a deles "perfeita"...

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  2. Concordo com vc, somos absurdamente moldado e passamos a ter um carater dissimulado.

    Pai? Eu preferia nunca ter conhecido o meu. Meu Pai sempre foi meu amigo, faziamos td junto, desde a ver um jornal a grandes aventuras. Tem mto dele em mim.. Mas a um tempo ele resolveu morar com uma vagabunda e desde entao, morri para ele. Preferia nao te-lo doke um dia viver essa dor da decepção.

    Vídeo-k7.. Eu acho que me lembro de qdo isso nao era mto comum...

    Eu te acho diferente, eu me acho diferente de td q conheço tbm. E fico puta, puta mesmo ao ver essas pessoas com as 'mesmices' e futilidades delas, sendo completamente feliz.

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  3. Oi, queriiiido!
    Adorei conhecer mais um pouco sobre você!
    És franco, transparente, sensível e cheio de qualidades!
    A qualquer momento vais encontrar uma garota que te mereça. Fique alerta!
    Bjkas, muitas!!!!

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  4. Oi Eduardo,

    Tive duas amigas que não tem pai. Uma delas, o pai tinha morrido quando ela era criancinha, mas perturbavam tanto ela porque ela não tinha mais pai, que ela passou a falar que tinha sim. Ela não gostava que a tratavam como se fosse uma "coitadinha" e por isso passou a falar que tinha pai para algumas pessoas que perguntavam. A outra amiga, o pai dela morreu também. Ela era da minha turma e ficou gravado na minha memória o dia que o pai dela morreu porque ela estava tipo aliviada. O pai bebia muito, ficava violento, então pra ela foi um alívio quando ficou sem o pai. Cada um com a sua história, entende? Quando não é uma coisa é outra.

    Sobre as coisas padronizadas, uma coisa que eu acho estranho é com as mulheres que já estão um pouco mais velhas. Todas têm que usar o mesmo corte de cabelo, já reparou? Mas isso é assim aqui no Brasil. Nos Estados Unidos onde morei, as pessoas podem ter sua individualidade e ninguém tem nada com isso. Ninguém repara. Por isso é cada um mais estranho que o outro lá. Eu por exemplo, adoro chapéu, mas se eu for usar chapéu aqui, mesmo no Rio de Janeiro, que é uma cidade moderna e tal, vão achar que sou uma ET.

    Sobre namorar, cada um tem seu tempo... Tenho uma prima que nunca tinha tido namorado, nunca nem beijou nem andou de mãos dadas. Agora com 60 anos ela arranjou o primeiro namorado. Ficou noiva e vai se casar agora em julho. O noivo tem 86 anos!!!

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  5. Felizmente tive um pai muito legal. Mas entendo vc. A paternidade é um pouco relativa. Muitas ~mães preferiam assim. Hoje já não acontece tanto, até porque as mulheres aprederam muito sobre seus direitos.

    Un bom blog

    Abraço

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  6. bom, ñ considero o mundo tao padronizado assim, se o eh, ta sendo forçadamente. ha mtas crianças sem pai, ha mtos caras q chegam a idade adulta sem sequer beijar, ha ainda hj (apesar da popularizaçao)pessoas sem telefones fixo ou celular.

    eh mta pequenes mental achar q todo mundo deve ser igualzinho, direitinho, perfeitinho. vc eh diferente, assim como eu, assim como as pessoas q comentaram acima de mim (desc, ñ li seus comentarios), ai eh q ta a beleza da vida, a diferença! q graça tem o branco se ñ existe o preto?

    tenho historia familiar diferente da sua, mas pelo pouco q pude ler, apesar de eu ter pai e mae, sua vida familiar foi mais sadia. pode acontecer, pq ñ, oras? um pai e uma mae sao pessoas, como nos! q tb tiveram uma fase como a nossa ou diferente (pra pior ou melhor, vai saber), ñ somos robos com numeros de serie impressos na gente.

    continuando as diferenças e similaridades, tenho quase sua idade. ñ gosto de futebol, ñ vejo nem jogo da seleçao (semelhança a vc), mas em compensaçao ñ tenho emprego (diferença). acho q devemos mudar essa ideia q temos q sermos iguais, ñ da pra lutar contra nossa natureza, o maximo q podemos fazer eh conseguir conviver com o diferente e novo. mudar nossa essencia ñ, isso ñ mesmo!

    as vezes o q o mundo precisa eh um pouco de estranheza

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