7

Sobre molhar os pés, caminhar orando, ser outra pessoa e idolatria.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Gozado como o nosso cérebro funciona. Como substitui uma sensação por outra, um sentimento por outro, talvez, creio eu, para tentar nos manter sãos da melhor forma possível. Mais ou menos como (e não sei se isso existe) uma pessoa que não pode comer doces e para não se frustrar, passa a odiar essas guloseimas. 
Durante toda a minha vida, até mais ou menos um ano atrás, eu tinha muita, muita necessidade das pessoas.
Não só da companhia delas, mas da aprovação, da aceitação, da compreensão e do amor. Para que as pessoas gostassem cada vez mais de mim eu era capaz de tudo. Fazia tudo o que estivesse ao meu alcance para agradar a pessoa da qual queria afeto e atenção. Era aquele tipo ridículo de pessoa que seria capaz de deitar no chão, sobre uma poça d'água para a outra pessoa poder atravessar pisando em mim sem molhar os pés. Desde que isso fizesse a pessoa gostar mais de mim, estava ótimo, comeria até merda se fosse preciso. 
Sempre soube que agir dessa forma era errado, que isso não me trazia mérito nenhum, muito pelo contrário, só me fazia digno de pena do meu objeto de afeto e muitas vezes, obsessão. Contudo eu simplesmente não conseguia pensar em outra maneira de chamar a atenção do outro, por mais que eu soubesse que estava me prestando a um papel ridículo eu continuava nisso porque tudo o que me importava era a outra pessoa


As vezes sigo uma novela ou outra. A última que segui com atenção foi A Favorita, da Flora e da Donatella. Na trama, a Flora tinha uma obsessão doentia por sua amiga Donatella, queria fazer tudo o que ela fazia, queria ter tudo o que ela possuía, enfim, queria ser ela. 
Acho que gostei da novela, me interessei porque de certo modo me identifiquei bastante com a Flora. Eu sempre me odiei, nunca me amei de verdade, sempre quis ser qualquer pessoa menos eu mesmo. Sempre buscava comprar roupas parecidas com as dos meus amigos, gostar das mesmas coisas, ouvir as mesmas músicas. Sempre achando que agindo assim a pessoa veria como sou parecido com ela e passaria a gostar muito mais de mim. 
Me lembro que, nos últimos capítulos da novela, em uma conversa que a Flora teve com a Donatella ela implorou pra amiga: "_Por favor, fica comigo! Eu só preciso que você fique perto de mim. Você pode até me odiar se quiser, mas não saia de perto de mim!" .
Eu terminei de ver esse capítulo e fui pro banheiro chorar. Fui porque essa cena bateu um mim como uma luva de boxe, porque é exatamente o que eu sentia por dentro em relação a muitas pessoas. Muitas vezes, andando pelas ruas chorando e rezando, chegava a pedir à Deus a mesma coisa: "_Deus, por favor, não deixe fulano se afastar de mim. Mesmo que ele não queira falar comigo, mesmo que ele não goste de mim, por favor Deus, faça com que ele nunca saia da minha vida!" . 
Em certa ocasião um antigo amigo me disse mesmo, "Você age de uma forma que parece que se eu não estiver perto de você, não estiver onde você possa pelo menos me ver, você entra em crise!". É, pois é.


Não importava o quanto eu implorasse a Deus, sempre acabava do mesmo jeito. No final eu percebia que esse sentimento de apego, esse amor, se é que se pode chamar isso de amor, só vinha da minha parte. A outra pessoa muitas vezes na verdade nem se dava conta de que eu gostava tanto assim dela e geralmente ficava muito incomodada quando descobria. As pessoas querem amor, gostam de ser amadas, mas é curioso como elas querem ser amadas da forma que elas querem, não do jeito que você oferece. Inclusive eu, admito. 
Desde criança eu sempre agi dessa forma compulsiva. Fazia um amigo, me apegava a ele, fazia tudo por ele e acabava esperando o mesmo em troca. Quando isso não acontecia eu ficava absurdamente magoado e meu mundo desmoronava, pois havia depositado todas as minhas expectativas de felicidade naquela pessoa. Eu como já disse, nunca tive um relacionamento amoroso de nenhum tipo, mas sei muito bem o que é se apaixonar por alguém. As pessoas são limitadas, definem a paixão de uma forma muito direta, uma coisa romântica, sexual, sei lá. Mas a paixão em si pode ser por qualquer coisa. Tem pessoas que são apaixonadas pelos seus bichos de estimação a ponto de tratá-los como filhos, outros são apaixonados por um determinado lugar, um acontecimento. Paixão por chocolate, paixão por um filme que marcou a sua vida, uma determinada música. Paixão não é só namoro, beijos, sexo, não é só tocar. Paixão é um sentimento muito mais profundo e humano


Cada vez que eu me decepcionava com alguém eu percebia onde errava e sempre me dizia que "Nunca mais vou me deixar levar. Nunca mais vou cometer o mesmo erro novamente". Mas toda vez sempre foi a mesma coisa, carência, apego, decepção. 
Gozado como o nosso cérebro funciona. Como substitui uma sensação por outra, um sentimento por outro, talvez, creio eu, para tentar nos manter sãos da melhor forma possível. Recentemente e por minha culpa, diga-se de passagem, decepcionei-me com várias pessoas. Digo por minha culpa porque como sempre, esperei delas o que elas não puderam e não quiseram me dar. Apesar de saber que elas não tem essa obrigação, como sempre e automaticamente me magoei demais. Se as pessoas não podem lhe dar afeto, o que esperar delas então? 


Só que dessa última vez foi diferente, não sei bem o que houve, mas algo mudou profundamente em mim depois dessas últimas decepções. Aquela sensação, aquele desejo que eu tinha de querer pessoas ou uma pessoa sempre perto de mim de repente foi embora. Foi embora não, mudou. De repente todas as pessoas, sem exceção começaram a me dar muito nojo. Não tenho mais vontade de estar com elas, de me relacionar, de buscar afeto, compreensão ou amizade. 
Quando decidi recentemente me afastar de todos ao meu redor eu sabia que iria sentir e realmente senti um vazio muito grande. Chorei, me culpei, tive altos e baixos. Durante noites desejei voltar no tempo, pensei em procurar pessoas e implorei a Deus que elas me procurassem, mas nem uma coisa nem outra aconteceu. 


Já citei isso aqui no blog várias vezes, mas existe aquele ditado que diz que aprendemos as nossas lições de vida pelo amor ou pela dor. E eu sou o tipo de pessoa que sempre vai pelo caminho mais difícil e passo por situações dolorosas pra mim. Mas creio também naquele ditado que diz que Deus escreve certo por linhas tortas e aprendi a não ignorar nada do que me aconteça seja bom ou ruim. 
Nada na nossa vida acontece por acaso, sejam alegrias ou tristezas. Alguns aprendem isso de primeira, outros como eu, apanham, apanham e só depois percebem determinada coisa. 
Todo aquele meu sentimento de necessidade do outro, de carência, foi substituído por desprezo. Perdi tantos anos da minha vida idolatrando as pessoas, esperando delas que atualmente além de desprezá-las não espero absolutamente mais nada delas. Pra que? Pra sofrer de novo? Pra me decepcionar de novo? Não, dessa vez não. Prefiro estar só do que mal acompanhado.


"- Vós não sois absolutamente iguais a minha rosa, vós não sois nada ainda. Ninguém ainda vos cativou, nem cativaste a ninguém. Sois como era minha raposa. Era uma igual a cem mil outras. Mas eu fiz dela um amigo. Agora ela é única no mundo.
E as rosas estavam desapontadas.
- Sois belas, mas vazias, disse ele ainda. Não se pode morrer por vós. Minha rosa, sem dúvida um transeunte qualquer pensaria que se parece convosco. Ela sozinha é porém mais importante que vós todas, pois foi a ela que eu reguei. Foi a ela que pus sob uma redoma. Foi a ela que eu abriguei com o paravento. Foi dela que eu matei as larvas ( exceto duas ou três borboletas). Foi a ela que eu escutei queixar-se ou gabar-se, ou mesmo calar-se algumas vezes. É a minha rosa."

O Pequeno Príncipe - Antoine de Saint-Exupéry






Adicionar aos Favoritos BlogBlogs

Bookmark and Share

7 Divagações

  1. Como diria a música de Renato Russo: "Se você quiser alguém em quem confiar, confie em si mesmo". Às vezes, a gente se decepciona demais com alguém, às vezes, essa decepção vira rotina. Mas, como disse, nada é por acaso. Acho que tudo é um aprendizado... Um duro e árduo aprendizado.
    Obs: O layout novo está show!

    ResponderExcluir
  2. Comentei exatamente isso noutro post seu, também já fui muito humilhada, tanto que "aprendi" e não vou atrás de ninguém (a não ser que eu considere que valha a pena),o ruim é que acabamos "criando casca" e se deixar ela toma conta de nós...cuidado.

    bjãooo

    ResponderExcluir
  3. Eduardo!
    Acredito que o ideal na vida é o meio-termo: nem 8 nem 80!
    Não precisas sair de um extremo e ir ao outro para te encontrar. Busque um meio-termo. Goste de quem te respeita, te considera e não se sinta obrigado a gostar de quem não te agrada. Não precisa odiar.Basta ignorar.
    Acredito também que para sermos felizes com os outros, precisamos primeiro aceitarmos a nós mesmos,aprender a conviver com as nossas qualidades e defeitos, pois se não gostarmos de nós mesmos, como poderemos gostar dos outros???
    Em relação aos vinte blogs é o seguinte: fui professora de Português/Inglês por 28 anos. Sempre gostei de escrever e ler, é claro! Ao descobrir a blogosfera, me apaixonei. E como, modéstia à parte, me considero uma pessoa muito criativa, fui criando novos blogs, cada um com um tema diferente. Não caberiam todas as ideias num só blog. Faço tudo com um imenso prazer. Para mim, não é trabalho, é lazer! Se fosse chato, não o faria. Adoro blogar! Gostaria de ter mais tempo para trabalhar neles e para visitar os amigos e amigas.
    E visitar blogs com um visual como o do teu é bom demais. É como ir a uma casa bem decorada e de bom gosto. Claro que os textos e postagens, em geral, são o mais importante. Mas o visual complementa, não é mesmo?
    Bom final de semana, sem depressão, meu querido!
    Agora vou visitar o teu blog de designs!
    Bjkas, muuuuitas!

    ResponderExcluir
  4. Essa coisa de se decepcionar com as pessoas é complicado.Eu me decepcionei a primeira vez com uma pessoa aos 15 anos e desde esse dia,eu levantei um muro em volta de mim e nunca mais deixei ninguém entrar na minha vida,de verdade.Sei que deixei de fazer ótimos amigos,conhecer pessoas que realmente valessem a pena,mas como eu disse é complicado essa coisa de decepção e cada um reagi de uma maneira.
    Apesar de vc ter aprendido pelo caminho mais difícil,pense que pelo menos daqui pra frente vc não sofrerá mais com isso.
    Bom fim de semana.

    ResponderExcluir
  5. Você tem alguma ideia do por que é (ou agora seria melhor um foi?) assim, Eduardo?
    Acho que todo mundo quer se sentir amado e querido mas o seu sentimento parece mais obsessivo e desesperado que o considerado 'comum' (e essa constatação não é uma crítica, espero que não se ofenda).
    Acha que, inconscientemente, isso pode ter alguma relação com nunca ter conhecido seu pai? Ou por ter sido muito mimado e protegido por sua mãe?
    Não sei, tem gente que acha que como nós somos é resultado direto de algo que nos aconteceu (ou que deixou de acontecer) e do meio em que vivemos quando criança; ou que é alguma coisa relacionada com genética ou ainda que é uma coisa sem explicação.
    De repente me bateu essa curiosidade sobre sua história, então repetindo a pergunta...É uma coisa que você se importa em descobrir um dia o por que do ter tido sempre essa necessidade das pessoas ou não se interessa pelo motivo que causou tudo isso (se é que você ache que há algum, claro)?

    ResponderExcluir
  6. Amado, compreendido, valorizado e querido, todos nós queremos ser. Precisamos ser, pois convivemos. Sem o(s) outro(s),ninguém, só nos resta morrer.

    Mas obssessão é outra parada, né?

    E todos nós somos amados de algum modo,e precisamos das pessoas, mas nem de todas elas.
    Então, que bom que você não precisa mais delas obssessivamente, mas não precisar de ninguém, ai você já tem outro problema. Bjo

    ResponderExcluir
  7. Eduardo, mandei sem querer um recado com a assinatura Bacaninha, um blog que até já tá extinto. Desculpas. Mas já sabe que foi meu. :(

    ResponderExcluir

Muito obrigado por comentar. Sendo contra ou a favor de minhas opiniões, as suas são muito interessantes para mim. Tenha certeza!