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Sobre recusas e ausências, fraquezas e defeitos e bolos de suspiro com morangos

segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Se nos últimos anos meu aniversário já vem se tornando cada vez mais irrelevante, o que dizer agora, nesse ano de 2020, com a pandemia do mortal Coronavírus?

Há algum tempo estava conversando com meu amado amigo João sobre a relevância dos aniversários depois de um tempo. Há quem ache fundamental uma comemoração, com muita comida e bebida, música, a casa cheia de familiares e amigos. Para muitos é algo tão natural que quando você fala que não faz questão de comemorar, a maioria das pessoas te olha como se você fosse um doente mental.

Sei que tenho amigos que gostam verdadeiramente de mim, que me querem bem, mas nunca senti de fato que sou importante o bastante para que meu nascimento seja motivo de festa. Lógico que na infância tive muitas, com aqueles bolos de suspiro branco e morangos, garrafas de guaraná sobre a mesa, daquelas de vidro, balas de coco e brigadeiro. Depois de adulto tentei algumas vezes, chamando amigos pra ir em algum lugar, um barzinho, um restaurante, e foi bacana, seria injustiça dizer que não, mas percebi que o esforço para conseguir reunir as pessoas para comemorar comigo se tornou mais difícil.

Sei que isso se deve, em partes, pela própria vida adulta. Quando crianças temos tempo livre de sobra. Nossas únicas responsabilidades são ir a escola e fazer tarefa, estudar para as provas, fora isso é seguir vivendo nossa vidinha. E no dia do seu aniversário era fácil encher a casa, inclusive com um monte de outras crianças as quais você nem fazia ideia de quem eram. Amigos de amigos, o sobrinho do vizinho, com o qual você jamais trocou uma palavra, mas ninguém tava nem aí. Os adultos sentados na sala ou na varanda, bebendo sua cerveja e conversando sei lá sobre o que e as crianças brincando de pega-pega, rindo, tropeçando, chorando e fazendo novas amizades da forma mais fácil do mundo.

A gente cresce e de repente coisas simples ficam complicadas. Quanto mais envelhecemos mais sentimos a obrigação (imposta pela sociedade, diga-se de passagem) de nos provarmos a nós mesmos e aos outros, acho que principalmente aos outros. Temos de ser adultos responsáveis e independentes, conquistar nosso espaço num mundo tão disputado. A vida é uma só, o tempo não para e em algum momento vai se esgotar, então temos a obrigação moral e social de conseguirmos coisas, de sermos alguém antes que a areia da nossa ampulheta particular se esvaia.

Temos que ter um bom emprego com uma profissão de respeito, casar, ter filhos, uma casa. As pessoas é que tem que precisar de nossa ajuda e não o contrário. Tempo livre, e diversão se tornam luxos que acreditamos merecer somente vez em quando. Solidão e carência, saudade, nostalgia se tornam problemas psicológicos que precisamos tratar, afinal, "pessoas normais" não tem dessas coisas, fraquezas e defeitos que precisam ser corrigidos.

Embora eu esteja vivendo a vida adulta e tentando me encaixar nesses parâmetros exigidos pela sociedade não quer dizer que goste. Não podemos ser eternamente crianças como Peter Pan e nem viver nossas vidas sem qualquer responsabilidade ou uma meta, mas a forma como todas essas obrigações se sobrepõe ao nosso espírito me sufoca, principlamente na forma como isso afeta as relações humanas, como depois que passamos de certa idade e vamos tendo que nos esforçar mais para realizar as nossas expectativas (e as dos outros), ninguém tem mais tempo pra ninguém. "Preciso trabalhar, preciso continuar meus estudos, cuidar dos meus filhos, conquistar as coisas que quero". Tá, faz parte, lutar contra essa rotina de vida é tentar nadar contra a correnteza do que a humanidade se tornou. Mas tem um lado triste foda, pra quem é mais sentimento do que razão como eu, isso desanima.

Por isso desisti de comemorar meus aniversários há alguns anos, fazendo festas ou chamando várias pessoas pra ir em algum lugar comer. Me frustro muito facilmente com recusas e ausências e preferi não mais passar por isso. Além de me frustar ainda acabo ficando um pouco magoado e não quero isso pra mim. Prefiro hoje chamar dois ou três amigos mais próximos para tomar uma cerveja, comer um lanche e pronto, sem pompa, sem presentes, sem votos de felicidades. Fazendo isso, acabei desconbrindo que as poucas pessoas que se importam com a data realmente se importam. Percebo que essas poucas pessoas, esses poucos amigos verdadeiros que ainda tenho, quando me parabenizam o fazem por carinho e amizade verdadeiros, não apenas porque a data foi marcada em uma rede social ou coisa do tipo.





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