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Sobre macacos escravagistas, crer ou não crer e palitos de dente humanos.

quarta-feira, 15 de julho de 2020


Nos filmes de ficção, quando um vírus mortal assola a humanidade temos dois cenários comumente explorados: ou quase toda a população mundial vem a óbito por alguma doença ou se transformam em monstros devoradores de gente, mortos-vivos, como na série The Walking Dead. Tem também aquela situação onde macacos ficam superinteligentes e dominam a raça humana, mas aí é querer demais. A garotada curte, imaginando como seria divertido estourar os miolos dos monstros com um taco de baseball ou um tiro na testa.

Bem, passamos da metade de 2020 e dessas diversas possibilidades até então pouco ou nada críveis, uma tornou-se real: estamos há meses enfrentando um vírus potencialmente letal que já matou milhares de pessoas no globo, há meses sendo obrigados a usar máscaras de proteção quase o dia todo e adotar medidas de prevenção com as quais não estávamos habituados. E apesar de não termos zumbis gemendo pelas ruas e nem pessoas purulentas se dissolvendo em poças de gosma, cidades em ruínas e carros em chamas, a chegada dessa pandemia inesperada criou seus monstros, mudou alguns de nós e, ironicamente, ao sermos obrigados a vestir máscaras, fez outras caírem.

Esse ano está pesado, difícil de levar não apenas por causa do Coronavírus. Sim, claro, considero a pandemia o principal motivo, mas eu tenho sentido, e não sei se é algo mútuo, que as coisas no mundo estão se degradando de forma mais acelerada nos últimos tempos. Coisas ruins tem acontecido com mais constância e a humanidade, ao invés de aprender com os erros, de evoluir, o que seria o processo natural, tem regredido, piorando suas falhas e ficando mais e mais bélica e desunida. E apesar disso ser algo que, sinceramente não me surpreende, não quer dizer que não seja incômodo.

Temos o arrogante hábito de acreditar que os piores períodos da história humana nunca irão acontecer na nossa geração, que o pior já passou e que essas tragédias anunciadas de que os especialistas tanto falam, derretimento das calotas polares, guerras, graves pandemias, vão acontecer daqui a muito tempo no futuro. "Já vou estar morto mesmo, então isso não me diz respeito, não devo me preocupar ou me prevenir". Fala-se muito em preservar o Planeta e mudar nossa mentalidade pelo bem das gerações futuras, nossos filhos, mas a cada dia, a cada tragédia ou dificuldade que a humanidade enfrenta, fica mais claro o fato de que não conseguimos enxergar tão adiante, na verdade não queremos nos esforçar para isso.

Inconscientemente (alguns de forma bem consciente) seguimos aqueles ditados chulos do tipo "o futuro à Deus pertence", "o que tiver de ser, será", "vamos viver o agora, pensar no hoje". Sou da opinião de que tudo no universo é aleatório, o bem, o mal, bênçãos e tribulações, essa pandemia e as mortes que vem causando e ainda vai continuar a causar por um tempo. Acredito que, com nossas mentes pequenas, não conseguimos aceitar ou lidar com a aleatoriedade do universo, então, no desepero buscamos jutificativas: Se as coisas dão certo foi porque Deus assim quis, se tudo está desmoronando é porque Deus quis ou por influência do Diabo. Cogitamos e buscamos acreditar em todas as vertentes possíveis e imagináveis, porque admitir a menor possibilidade de que estejamos sozinhos, de que a raça humana e suas desgraças são consequências do aleatório cósmico é bem assustador. Desesperançoso.

No cinema, sempre vemos a humanidade se unir em tempos escuros, juntar suas forças e esquecer suas diferenças para superar algo ou alcançar um objetivo comum. Tudo muito bonito, bastante inspirador, mas pelo visto não o bastante, a realidade é bem diferente. Se houvesse um apocalipse zumbi na vida real, nada aconteceria como nos filmes e séries. Se não conseguimos sequer unir forças para combater eficazmente o Coronavírus, quem dirá matar zumbis e ficar com a mocinha no final. Seríamos devorados e eles ainda usariam nossos ossos como palitos de dente.

É ingenuidade, nessa altura do campeonato acreditar que as pessoas "não entendem a gravidade da situação", que estão mal informadas. Não, elas entendem, apenas não querem aceitar que essas coisas estão acontecendo e que não tem data pra acabar, que não importa o quanto orem, o quanto culpem o Diabo ou uns aos outros, tudo o que tiver que vir virá e vai durar o tempo que durar, quer você goste ou não. Então significa que não devemos ter fé, não devemos crer em Deus, orar, pedir a ele que nos ajude? Claro que sim, acho válido, de tudo o que escrevi até aqui, essas são as minhas opiniões. Posso estar indo por um caminho muito errado e sinceramente espero que esteja. Certa vez uma pessoa me perguntou se eu acredito em Deus, se sigo alguma doutrina ou religião. Eu disse que acredito nas coisas ao meu modo e que vivo bem com isso. Ele me disse que tudo bem, que é direito de cada um acreditar ou não no que quiser, mas que é preciso tomar cuidado com isso, pois o problema de não se ter fé ou esperança em nada é que, pode acontecer de na hora em que você precisar se apoiar em algo, não tenha nada para te consolar.

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