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Um pouco de vida a menos. E contando.

terça-feira, 22 de julho de 2014

Entre ser careca ou ter cabelos grisalhos, prefiro muito mais ter belas madeixas prateadas, como a luz do luar, do que um aeroporto de mosquito na cabeça, acho muito mais sedutor. Todavia, ao que parece, vou acabar com um misto dos dois e me tornar um senhor calvo e com restos de cabelos brancos, já que o estresse é uma constante em minha vida, não é de hoje e não porque eu o busque. Pela sétima ou oitava vez, já perdi a conta, minha mãe tentou cometer suicídio, da mesma maneira original e eficiente de sempre: tomando toda uma cartela de calmantes de tarja preta. Feliz ou infelizmente, sinceramente já cheguei num nível de estresse no qual não consigo mais distinguir, ela sobreviveu, graças aos esforços de minha tia, sua irmã, minha segunda mãe. Diagnosticada há anos com o chamado Transtorno Bipolar, como disse, não é a primeira vez que minha mãe, usando seu transtorno, nos transtorna, a minha tia e a mim. Apesar de sabermos que ela é doente e que precisamos ter força para suportar suas crises, não significa que seja fácil ou que não seja, tanto para minha tia quanto para mim, algo muito desgastante, física e mentalmente.


O gatilho é sempre o mesmo: a não conformidade com os rumos que sua vida tomou, devido às suas próprias escolhas. Embora sejamos uma família humilde, minha tia, ela e eu, minha mãe sempre foi uma pessoa muito ligada aos bens materiais. Ter uma vida feliz, no ponto de vista dela, não é ter saúde ou paz, mas dinheiro para comprar saúde e paz. E entenda “paz”, para ela, como roupas, muita comida e conforto. Temos tudo isso, não nos faltam roupas o suficiente, comida o bastante para não passarmos fome e o conforto necessário para não passarmos frio. Moramos de favor em uma casa que não é nossa, mas temos quatro paredes e um teto para nos abrigar, mas lógico, para ela, nenhuma dessas coisas jamais foi o suficiente, afinal, as outras pessoas tem mais que isso, sendo assim, no ponto de vista dela, a vida tem a obrigação de lhe prover isso também, sem esforço algum. Não vou ser injusto e dizer que se trata apenas do seu egoísmo e uma certa soberba ou mesmo que sejam apenas sintomas do Transtorno Bipolar. Ela teve uma Infância pobre, sofrida, um pai ignorante, rígido e uma mãe apática. Impedida pelo meu já falecido avô, de fazer muitas coisas, de seguir sua vida da forma que desejou e inclusive impedida de continuar estudando, pois naquela época, lugar de fêmea era na cozinha e cuidando de uma penca de filhos, ela cresceu e se tornou uma pessoa cheia de traumas, neuroses, mágoas e rancores, primeiro dos pais, atualmente, do mundo.


Hoje, depois de suas várias tentativas de suicídio, já estou mais “escolado”. Além de todos os problemas que já citei, outro dos muitos motivos pelos quais ela tenta se matar, de acordo com ela mesma, sou eu. Ela hoje, me culpa pela maior parte de suas infelicidades e frustrações, alega que deixou de viver sua vida, de fazer o que teve vontade, para cuidar de mim, filho único. Diz que, se eu não tivesse nascido, ela poderia ter feito o que sempre sonhou da vida dela: viajar pelo mundo, sair para ver o mar e as coisas que ela via na televisão, juntar dinheiro para poder viajar e, quem sabe, se tornar uma arqueóloga, no estilo Indiana Jones. Todas as vezes nas quais ela já tentou se matar, discutimos antes, brigamos feio, trocando berros e acusações. Tenho um caminhão de defeitos e imperfeições, mas hoje, trabalho o dia todo, estudo a noite e o dinheiro que ganho, gasto parte com as despesas da casa, portanto não admito ser acusado por ela de nada, exceto de ser agressivo demais e perder o controle emocional facilmente, defeitos que preciso corrigir urgentemente, já que, num acesso de fúria, dei um soco na estante durante essa última discussão e por pouco não fraturei a mão, contudo, jamais lhe agredi fisicamente e jamais farei isso. Sinceramente, vontade não me falta, confesso, nem a minha tia, já que, quando ela está em crise, somos obrigados a ouvir barbaridades, acusações sem sentido e ofensas dolorosas, mesmo fazendo o nosso Possível para tentar ajudá-la.


Esses últimos dias tem sido tensos, irritantes e cansativos para minha tia e eu, um inferno, sem exageros. Ela tentou se matar na sexta-feira, mas somente no domingo tivemos que chamar uma ambulância para levá-la ao pronto socorro. Desde que ela voltou, ainda no domingo, à noite, tem estado completamente drogada, devido aos muitos remédios que tomou para acabar com seu “sofrimento”. De acordo com os médicos, ela vai permanecer assim pela semana toda, até o organismo se limpar. Nesse meio tempo, minha tia e eu estamos cortando um dobrado com o trabalho que ela vem nos dando, já que está completamente sem condições sequer de se alimentar ou se limpar sozinha. Muito obesa, ela pesa demais, mesmo escorada por duas pessoas, minha tia já tem idade, é bem magra e tem problemas de coluna, eu, alem de magrelo, sou vergonhosamente fraco fisicamente o que dificulta termos que carregá-la pra lá e pra cá, pela casa. Fora de si como ela está no momento, é comum ela não conseguir conter suas necessidades, sujando a si mesma, as roupas que usa e até mesmo a nós, quando tentamos “carregá-la”, exalando mau cheiro por onde passa. Mal temos, minha tia e eu, conseguido ter uma noite de sono tranquila, já que ela acorda várias vezes no meio da madrugada, querendo ir ao banheiro ou achando que já amanheceu, querendo passar o café. De sexta pra sábado eu fui obrigado a passar a noite sozinho com ela, pois minha tia está, quer dizer, estava cuidando de uma senhora idosa, uma vizinha que caiu e quebrou o ombro, estava dormindo com ela. Na manhã de sábado, quando minha tia chegou em casa, comigo ainda dormindo, a cozinha estava um caos, pois, completamente drogada, minha mãe se levantou cedo e ao tentar fazer um café, ateou fogo no suporte de coador, queimando todo o fogão e espalhou água e pó de café pela cozinha toda. Descobrimos pouco depois que ela também deixou uma boca de gás aberta, por sorte, o botão está defeituoso e o gás não ficou vazando.

Vou viajar para o Anime Friends 2014, sábado que vem, na cidade de São Paulo e com o que houve, não estou nem um pouco empolgado ou disposto, pelo contrario, estou mal humorado e bastante cansado. Contudo, apesar dos pesares, não vou deixar de ir e tentar me distrair, divertir, infelizmente garanto que não vai rolar, mas uma distração está garantida, embora parte de mim vá estar aqui na cidade de Bauru, preocupado com minha tia e com o trabalho que minha mãe estará dando a ela. Vou procurar não me desgastar demais também, pois no ano passado, andei demais sob o sol e voltei pra casa doente, desde o ônibus, com uma insolação que me derrubou por quase duas semanas, com direito a vômitos, diarréias incessantes e febre de 38,5º. As cólicas vieram de bônus. Estou me preparando psicologicamente para aguentar a viagem de ônibus, quatro horas totais, num veículo repleto de adolescentes imbecis e marmanjos já barbados e provavelmente virgens jogando card games de Pokémon® e Game Boy Advance®... do Pokémon®. Ainda assim vou tentar entrar no espírito da coisa, afinal, como dizem: “Se você está no inferno, abrace o K.P.Ta” (eu disse isso, na minha primeira transa, acho). Não pretendo vir lotado de souvenirs como vim da primeira vez. Tudo muito caro e em sua grande maioria, desnecessário. De repente posso comprar uma nova Action Figure, quem sabe, mas não sei, as que tenho guardei numa caixa vedada, estavam empoeirando na estante e eu acho isso deprimente. Talvez um dia, se eu chegar a ter um canto meu, volte a expô-las. Até lá, vou indo como manda a corrente.


EDUARDO MONTANARI
Virginiano, bauruense, estudante de Design, ilustrador e web designer. Amante de cinema, quadrinhos, boa música e outras nerdices.



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