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Sobre galáxias muito distantes, copos e amores desgraçados.

terça-feira, 19 de junho de 2018




Dizer que nunca fui fã da aclamada saga de filmes Star Wars (Estrela Guerras) seria mentira. Gosto de desenhar desde que me entendo por gente, adorava criar histórias em quadrinhos e muitos dos meus personagens e tramas eram inspirados, melhor dizer, plagiados dessa tão famosa franquia cinematográfica, meus heróis usavam sabres de luz, meu vilão vivia numa bola de metal no espaço. "Rolbs, os guerreiros de Rolbstron". Nome ridículo, eu sei, mas na época eu me achava o Stan Lee tupiniquim, com meus tocos de lápis de cor e giz de cera.
Hoje, depois de adulto já não ligo tanto, a magia da trilogia original parece ter sumido e vejo os novos filmes como caça níqueis, apesar de não serem de todo ruins. Pode ser que a vida tenha apenas me endurecido e eu não veja mais graça nas coisas que via antes, vai saber. Todavia uma coisa que sempre me cativou nos filmes desde criança foi essa coisa de "lado preto da força".
O conceito básico de Star Wars é que existiam os mocinhos e os bandidos e englobando eles todos existia a força, uma poderosa faca de dois gumes, que podia ser usada tanto para o bem quanto para o mal. E os vilões, óbvio, a usavam para o mal.
Mesmo muito pequeno eu já entendia sobre o que se tratavam os dois lados da força, os filmes eram muito didáticos sobre isso e modéstia a parte eu sempre fui uma criança mais intelectual do que a maioria da minha idade. Eu entendia que o que o filme queria dizer com essa metáfora da força é que, se você praticar o bem, ter pensamento positivo, ver o lado bom das coisas e das pessoas, escolher o caminho da justiça, então você é o mocinho e está do lado da luz, usando energias boas. Mas o mais interessante é que o filme também mostrava que os adeptos do lado preto não eram malvados simplesmente por serem assim, não escolheram pura e simplesmente se tornar vilões, mas foram levados a isso por cederem aos seus temores, suas fraquezas, por enxergarem o pior lado das coisas e acreditarem que não havia esperança. É bem o lance do copo meio cheio ou meio vazio. Acho que todo mundo que tem um mínimo de instrução entende o que quero dizer.
Pode até parecer para alguns, mas Darth Vader nunca foi o típico vilão clichê. Ele tinha todo o potencial para se tornar o mais poderoso dos Jedi e trazer equilíbrio a força, mas ao longo de sua vida coisas ruins foram acontecendo e ele se deixou afetar por elas, a metade vazia do copo passou a ser uma constante em sua vida. Ele teve perdas, cometeu erros e diante disso se deixou levar pelos seus sentimentos mais negativos.

Se fizermos uma auto análise e se você, assim como eu, conhece os filmes, podemos sentir muitas vezes o "lado preto da força" perto de nós, sussurrando em nossos ouvidos, arrepiando os pelinhos da nuca, nos dizendo que o melhor, que o caminho mais fácil é ceder à escuridão que muitas vezes sentimos nos cercar, que quer entrar em nós. Eu falo por experiência própria, pois apesar de lutar contra isso, confesso que sim, me deixei contaminar pelo meu lado sombrio e que há momentos nos quais sinto que não vou conseguir voltar, dependendo do caminho que escolho trilhar.
Ter consciência de suas escolhas ruins e lutar contra elas já é um começo. Nem sempre consigo, quem me conhece bem que o diga, quem já viu meu pior lado, quem ainda vê às vezes, quando estou tão sem esperanças e cansado que tudo o que vejo é o pior lado do mundo, das pessoas, o copo meio vazio. Isso quando não o vejo vazio por completo. Um exemplo disso: Tenho 41 anos e nunca namorei na vida. Dei uns beijos, uns amassos, fiz sexo quase sem motivação nem tesão e nunca passei disso. Não sou como a maioria dos humanos comuns, não consigo ter intimidade física com alguém que não conheça bem ou de quem goste. Me apaixonei somente uma vez, por um rapaz de outro Estado, um namoro virtual. Resisti de início, mas por insistência dele e carência de minha parte, resolvi me entregar a esse sentimento. Acabou não dando certo, como já era de se esperar, distância muito grande, vidas muito diferentes. Foi bom enquanto durou, mas muito ruim quando terminou, eu achei que estava preparado mas não estava. Sempre me afeiçoei fácil a pessoas que por algum motivo ou por outro supriam minha carência, mas nunca havia de fato me apaixonado, esperado tanto de algo, mesmo que uma parte de mim soubesse que muito provavelmente aquilo não daria certo, mas como disse, acabei resolvendo me entregar a esse sentimento, queria saber como era, queria sentir essa coisa boa que todo mundo comentava e a qual eu nunca tinha experimentado antes. Mesmo sendo à distância, melhor do que nada, pra quem nunca tinha chegado nem perto de sentir algo assim estava de bom tamanho.
Quando acabou foi como se eu tivesse perdido meu chão, o campo florido por onde eu vinha caminhando até então havia secado e morrido, tudo de bom que aquela experiência tinha me proporcionado até o momento perdeu o sentido, tudo pareceu uma ilusão. Me senti um idiota, culpado por ter me entregue a esse sentimento, mesmo sabendo que as coisas podiam desandar. Um copo meio cheio das coisas que aconteceram, um copo meio vazio das coisas que se foram e que não iriam mais voltar, tempo perdido, sentimentos desperdiçados.
Embora hoje eu ainda queira sentir isso novamente, algo em mim secou, não consigo mais acreditar que valha a pena investir, que não vá sofrer de novo, que não vou colocar minhas energias e meus sentimentos em algo que não vai durar. E depois o vazio novamente, o lado sombrio de algo potencialmente bom, o medo de fracassar, de ser abandonado novamente, de não ser bom o bastante, de não ser o que o outro precisa que eu seja.
As vezes optar pelo lado sombrio não é um ato de maldade, mas de autopreservação. Não que isso seja desculpa, mas uma justificativa pífia, um mecanismo protetor, o escolher não sentir para não sofrer, o escolher ver o pior para não se decepcionar quando o melhor não acontecer.
Só espero que eu consiga me desvencilhar disso antes do que Darth Vader conseguiu, quando já era tarde demais e malfeitos não puderam mais ser desfeitos. Dele para os outros e dele para si mesmo.







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